Propaganda eleitoral obscura

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Hoje o nosso escritório de advocacia traz um artigo do jornal O Globo sobre como funciona a propaganda eleitoral no Brasil, vamos à matéria:

Desde as eleições de 2018, a legislação no Brasil permite uma forma particular de promover anúncios de campanha na internet: o serviço de impulsionamento oferecido pelas próprias plataformas de mídia digital. Estudo do Internetlab mostra que o recurso foi pouco usado no último pleito, com grande preponderância do Facebook, mas, se a tendência no exterior for seguida por aqui, é esperado um aumento do investimento nessa forma específica de propaganda para este ano.

O impulsionamento é problemático por algumas razões, em especial porque permite a segmentação do público-alvo, o que pode funcionar como incentivo a que candidatos diferenciem maliciosamente suas propostas, de acordo com a audiência selecionada. Os critérios de precificação, além disso, são obscuros. Não há uma tabela fixa de preços por exibição do anúncio. Os valores variam segundo muitos critérios, como a demanda por espaço em um determinado público. Na prática, ocorre uma espécie de leilão pelas impressões em audiências particularmente disputadas.

A demanda, contudo, não é o único fator da equação, porque a própria empresa diz “subsidiar” os anúncios “relevantes” para que “custem menos”. Ou seja, o potencial de engajamento da mensagem é levado em conta pela plataforma, interessada nas interações que o conteúdo pode propiciar. Em artigo na revista “Wired”, um antigo executivo do Facebook fez uma comparação ilustrativa sobre a disputa por espaços na plataforma. Segundo ele, na acirrada disputa pela audiência dos estados indecisos nas eleições americanas de 2016, Trump levava vantagem sobre Hillary Clinton no leilão dos espaços porque suas postagens geravam maior engajamento. Tinha, então, mais espaço por menos dinheiro: “Essencialmente, Clinton estava pagando preços de Manhattan pelo metro quadrado no seu celular, enquanto Trump estava pagando preços de Detroit”.

Ainda que os critérios fossem objetivos – e não se sabe ao certo se são, porque o Facebook não esclarece a forma como os valora -, essa já seria uma prática preocupante do ponto de vista ético, ao menos no domínio eleitoral. No Brasil, em particular, discriminar preços aos candidatos seria inconciliável com a Constituição, já que a empresa de mídia social, nesse caso, estaria efetivamente contribuindo com a campanha daqueles que se destacassem no engajamento. O Supremo Tribunal Federal já decidiu, em 2016, que é inconstitucional a doação eleitoral por pessoa jurídica. Eventuais descontos na exibição de mensagens patrocinadas seriam definitivamente estimáveis em dinheiro ou, no mínimo, caracterizariam favorecimento indevido.

Para que o impulsionamento seja, então, considerado prática legítima na disputa eleitoral, é indispensável que as empresas que oferecem esse serviço tornem públicos os critérios de precificação e alcance das mensagens impulsionadas. Caso contrário, haverá sempre a suspeita de que, por razões corporativas, estejam oferecendo vantagens irregulares a candidatos cujo comportamento na rede esteja mais alinhado com seus interesses empresariais.

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Impresso: O GLOBO / RIO DE JANEIRO – RJ / Editoria: OPINIÃO

Autor(a): ROBERTO RICOMINI PICCELLI E RENATA ROCHA VILELLA

Tipo: Artigo / Veiculação: 03/08/2020 / Página: 02 / Assunto: COLUNAS

Roberto Ricomini Piccelli e Renata Rocha Vilella são advogados

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